Sustentabilidade na ecologia-mundo capitalista? : uma análise das contribuições nacionalmente determinadas brasileira e chinesa

Abstract

O Sistema Terra encontra-se em um processo de colapso ecológico. A espécie humana vivenciará um século de mudanças súbitas e irreversíveis provocadas pelo que os cientistas do clima denominam mudança de estado (state shift) do sistema biosférico. Se em meados do século XX a mudança do clima representava uma ameaça potencial, afastada no horizonte, no século XXI o fenômeno materializou-se. Por outro lado, os diálogos e negociações que se articulam na política internacional do clima comumente resultam em estratégias reformistas, que visam um ?capitalismo sustentável? e não solucionam a emergência climática de maneira efetiva, tampouco a mitigam. Isto posto, o objetivo geral desta dissertação consiste em analisar como a contradição entre o processo de valorização do capital e a sustentabilidade ecológica expressa-se na agenda internacional do clima, em especial nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) brasileira e chinesa, à luz da Economia Política dos Sistemas-Mundo e da perspectiva marxiana. Emprega-se como técnica de análise de dados a análise de discurso. Constata-se que os mecanismos político-ideológicos do ambientalismo liberal, quais sejam, a métrica do carbono, o desenvolvimento sustentável e a economia verde, na medida em que aprofundam a mercadorização da natureza, sustentam o processo de valorização do capital em uma nova etapa de acumulação na era da globalização neoliberal. Nessa direção, verifica-se que a NDC brasileira e a NDC chinesa reproduzem a ideologia da descarbonização (um componente da métrica do carbono) em seus discursos, embora o Brasil a faça especialmente porque reduz o problema da mudança do clima às emissões de gases de efeito estufa, e a China a faça principalmente porque aproveita a nova rodada de revolução tecnológica para estimular a obsolescência de mercadorias e sua produção em uma nova roupagem, agora ?verdes? e ?de baixo carbono?. A bifurcação que se manifesta com a crise estrutural do Sistema-Mundo Moderno apresenta um cenário favorável para a transição a um novo sistema histórico, porém a própria ideologia liberal obstaculiza as movimentações necessárias para tal. Ainda assim, salienta-se que a elevação da escala de produção e consumo global será indubitavelmente interrompida em um futuro próximo, seja pela transição planejada a uma sociedade pós-capitalista que respeite a relação metabólica da natureza, seja pelo colapso ecológico em curso.

Abstract: The Earth system is undergoing an ecological collapse. The human species will experience a century of sudden and irreversible changes caused by what climate scientists refer to as a state shift in the biospheric system. While climate change was once seen as a potential threat on the horizon in the mid-20th century, it has now become a tangible phenomenon in the 21st century. However, the dialogues and negotiations within international climate politics often result in reformist strategies that aim for \"sustainable capitalism\" but fail to effectively address or mitigate the climate emergency. Against this backdrop, the general objective of this dissertation is to analyze how the contradiction between the capital valorization process and ecological sustainability is manifested in the international climate agenda, particularly in the Nationally Determined Contributions (NDCs) of Brazil and China, from the perspective of World-Systems Political Economy and the Marxian perspective. Discourse analysis is employed as the data analysis technique. It is observed that the political-ideological mechanisms of liberal environmentalism, namely carbon metrics, sustainable development, and green economy, as they deepen the commodification of nature, support the capital valorization process in a new stage of accumulation in the era of neoliberal globalization. In this regard, it is found that both the Brazilian and Chinese NDCs reproduce the ideology of decarbonization (a component of carbon metrics) in their discourses, with Brazil primarily reducing the climate change problem to greenhouse gas emissions, and China capitalizing on the new wave of technological revolution to promote the obsolescence of commodities and their production in a new guise, now \"green\" and \"low carbon\". The bifurcation manifested by the structural crisis of the Modern World-System presents a favorable scenario for the transition to a new historical system. However, the liberal ideology itself hinders the necessary movements towards such a transition. Nevertheless, it is emphasized that the escalation of global production and consumption will undoubtedly be interrupted in the near future, either through a planned transition to a post-capitalist society that respects the metabolic relationship with nature or through the ongoing ecological collapse.