A hibridez material das Cortes de Contas como atributo determinante de sua organicidade e a metamorfose institucional dos Tribunais da Governança Pública

Abstract

O presente trabalho tem como hipótese central a importância da reafirmação da natureza híbrida dos Tribunais de Contas brasileiros como um atributo determinante da organicidade dessas entidades de controle da administração pública brasileira, dentro da arquitetura institucional do Estado desenhada pela Carta Magna brasileira e como elemento fundamental para a identidade dessas instituições, para a efetividade de sua atuação e, até mesmo, para a sua sobrevivência institucional. Essa premissa tem como consequência direta o impacto no modo como essas instituições de controle devem se auto-organizar, devendo nortear a estruturação organizacional interna, a postura institucional desses órgãos, o papel que cada categoria de agente público tem dentro da organização, a maneira como se iniciam e se desenvolvem os seus procedimentos de fiscalização e de julgamento, as formas de autuação e os critérios de distribuição dos processos de controle externo. A partir dessa proposta, a pesquisa analisa o histórico déficit de legitimidade do qual padecem esses órgãos de controle, pontuando alguns de seus fatores, a crescente hipertrofia do Judiciário, entre outros fenômenos, que terminam por gerar nas Cortes de Contas uma verdadeira crise de identidade, o que, por sua vez, tem consequências no modo como essas instituições exercem ou deixam de exercer suas competências constitucionais. Em meio a tudo isso, um ambiente desafiador de metamorfose do mundo, inclusive digital, que se encontra em marcha cada vez mais acelerada e que traz consequências, não apenas quanto ao funcionamento das instituições, mas, acima de tudo, exige mudança de mentalidades, ação e liderança sistêmica em toda organização, seja ela pública ou privada. Nesse contexto, vislumbra-se como necessário o estabelecimento de um novo paradigma de atuação das Cortes de Contas, as quais, superando a acepção clássica do termo ?contas?, transformam esses órgãos em verdadeiros Tribunais da Governança Pública, como atores necessários para um melhor funcionamento do aparato estatal como um todo, trazendo, com isso, melhorias para a nossa sociedade. Mas, mais do que isso, é preciso analisar criticamente e repensar a forma de atuação desses órgãos de controle, a fim de que, considerando o atual arquétipo de instituições republicanas existentes e as transformações em curso, identifiquemos qual o real papel dos Tribunais de Contas, como essas instituições podem e devem exercê-lo e, ainda, quais podem ser suas contribuições e entregas efetivas para os indivíduos e para a coletividade. Essa ressignificação orgânica tem relação direta com a atual quadra histórica de transformação pela qual passa a nossa sociedade. E as respostas a esses questionamentos passam, necessariamente, pela análise acerca da importância da natureza híbrida dos Tribunais de Contas como um elemento orgânico essencial, de ossatura constitucional, que termina por defini-lo ontologicamente e distingui-lo das demais instituições democráticas e republicanas, cada uma com seus importantes papéis e funções delimitadas constitucionalmente.

Abstract: The present work has as its central hypothesis the importance of reaffirming the hybrid nature of the Brazilian Courts of Accounts as a determining attribute of the organicity of these entities that control Brazilian public administration within the institutional architecture designed by the Brazilian Constitution and as a fundamental element for the identity of these institutions, for the effectiveness of their performance and, even, for their institutional survival. This premise has as a direct consequence on the impact on the way these control institutions should organize themselves, guiding the internal organizational structure, the institutional posture of these bodies, the role that each category of public agent has within the organization, the way its inspection and judgment procedures, forms of assessment and criteria for the distribution of external control processes are initiated and developed. Based on this proposal, the research analyzes the historical deficit of legitimacy that these control bodies suffer, punctuating some of its factors, the growing hypertrophy of the judiciary, among other phenomena, which end up generating in the Courts of Accounts a real identity crisis, which, in turn, has consequences for the way in which these institutions exercise or fail to exercise their constitutional competences. In the midst of all this, an environment of challenging the metamorphosis of the world, including digital, which is on an increasingly accelerated march and which brings consequences, not only regarding the functioning of the institutions, but, above all, requires a change in mentalities, action and systemic leadership in every organization, whether public or private. In this context, the establishment of a new paradigm of performance by the Courts of Accounts is seen as necessary, which, overcoming the classic meaning of the term ?accounts?, transform these bodies into true Courts of Public Governance, as necessary actors for a better functioning of the state apparatus as a whole, thereby bringing improvements to our society. But, more than that, it?s necessary to critically analyze and rethink the way in which these control bodies operate, so that, considering the current archetype of existing republican institutions and the ongoing transformations, we can identify the real role of the Courts of Accounts, how these institutions can and should exercise it and, still, what can be their contributions and effective deliveries for individuals and for the community. This organic reframing is directly related to the current historical transformation that our society is going through. And the answers to these questions go, necessarily, through the analysis about the importance of the hybrid nature of the Courts of Accounts as an essential organic element, of constitutional structure, which ends up defining it ontologically and distinguishing it from the other democratic and republican institutions, each with its important constitutionally delimited roles and functions.