O abuso do direito no direito sucessório brasileiro

Abstract

Este trabalho tem por objetivo determinar a possibilidade de aplicação do instituto do abuso do direito em relação ao exercício de posições jurídicas na esfera do direito sucessório. Adota uma abordagem indutiva, fundamentando-se principalmente na revisão bibliográfica, no levantamento jurisprudencial e na análise de casos concretos aptos a ilustrar situações que, concebivelmente, poderiam constituir um abuso do direito de suceder. O estudo é organizado em três partes. No primeiro capítulo, estabelece-se as bases para compreensão do instituto do abuso do direito, iniciando-se por seu desenvolvimento histórico desde o final do século XIX e findando-se na análise do estado da arte de sua aplicação prática por tribunais brasileiros selecionados, tanto no direito civil em geral quanto no direito sucessório, diante de sua positivação pelo art. 187 do Código Civil de 2002. O segundo capítulo dedica-se a discutir os fundamentos contemporâneos do direito de suceder sob a Constituição de 1988 e o Código Civil de 2002, traçando uma comparação com a lógica da codificação civil de 1916, bem como os limites legalmente impostos para o exercício do direito de suceder, a indignidade e a deserdação, e sua insuficiência enquanto normas de dever-ser na esfera sucessória. O terceiro capítulo busca aproximar os dois anteriores, aventando situações concretas em que se poderia constituir um abuso do direito de suceder, por meio da análise de casos julgados por tribunais brasileiros e da sugestão de circunstâncias hipotéticas. Conclui-se que o abuso do direito pode exercer um papel importante no direito sucessório, como meio de garantir também nessa área a observância de normas de conduta sistemicamente impostas e suprir lacunas normativas que o legislador não é capaz de prever taxativamente, suprimindo o direito sucessório do herdeiro que ultrapasse, em seu exercício, os limites ditados pela boa-fé objetiva.

The present work intends to determine the possible applicability of the concept of abuse of rights to the exercise of juridical positions within succession law. It adopts an inductive approach, based mainly on bibliographical review, on jurisprudential research and on the analysis of concrete cases that may demonstrate situations which may conceivably constitute an abuse of the right to inherit. This study is organized in three parts. In the first chapter, the basis for the comprehensions of the concept of abuse of rights are established through, initially, an overview of its development since the end of the XIX century, culminating in an analysis of the state of the art of its application in selected Brazilian courts, both within civil law in general and within succession law, in the face of its express legal stipulation on article 187 of the Brazilian Civil Code of 2002. The second chapter is dedicated to discussing the contemporary justification for the right to inherit under the Brazilian Constitution of 1988 and the Civil Code of 2002, in comparison with the logic of the 1916 civil codification, as well as the legally imposed limits to the exercise of the right to inherit, indignity and disinheritance, and their insufficiency in their role as norms of conduct related to such a right. The third chapter brings the previous two together, envisaging concrete situations in which there could occur an abuse of the right to inherit, through the analysis of cases decided by Brazilian courts and the suggestion of hypothetical scenarios. It is concluded that the concept of abuse of rights can play an important role within succession law, as a means of guaranteeing, in this area as much as in others, the observance of systemically imposed norms of conduct and of filling in normative gaps that the legislator is not capable of exhaustively predicting, eliminating the right to inherit of a successor that exceeds, in the exercise of that right, the limits dictated by objective good faith.