A dimensão jurídica feminina no regime de Vichy: entre a construção do ideário e as repressões de um governo autoritário (1940-1944)

Abstract

A partir dos estudos em história do direito pode-se verificar que pequenas ideias e movimentos sociais, surgidos no lapso temporal, provocaram grandes transformações nos campos jurídico, político e social, evidenciando a existência de uma cadeia de rupturas e continuidades. Nesse sentido, os estudos de gênero são fundamentais para o entendimento da função das mulheres no contexto social e histórico, além das suas resistências, sempre partindo da premissa que há uma subordinação estrutural imposta pelo patriarcado. Com base nessa perspectiva, a pesquisa adota uma abordagem histórico-crítica para analisar a condição jurídica das mulheres e a desigualdade de gênero no regime de Vichy (1940-1944), marcado por forte conservadorismo e repressão. A partir de fontes primárias e bibliográficas, busca-se compreender o impacto do regime sobre a vida feminina, abordando temas como os direitos sexuais e reprodutivos, a imposição do papel doméstico às mulheres e a obrigação moral de maternar. O objetivo foi construir um panorama crítico sobre o papel atribuído às mulheres nesse contexto histórico específico e ampliar a compreensão das estruturas de gênero na sociedade. Dessarte, verificase que, após a derrota da França na Segunda Guerra Mundial e a ocupação pelos nazistas, o regime de Vichy, liderado por Philippe Pétain, adotou uma ideologia autoritária, centrada nos pilares do conservadorismo. Promovendo valores tradicionais, o governo destacou a maternidade como um dever patriótico, restringindo o papel feminino à esfera doméstica e reforçando a moralidade, com apoio da Igreja Católica. As políticas em favor da família, de acordo com o discurso oficial, almejavam aumentar a taxa de natalidade e controlar rigorosamente a sexualidade feminina, tornando o aborto um crime contra o Estado e reprimindo práticas como o adultério e a prostituição. Desse modo, a política de Vichy fomentou um rígido controle sobre os corpos femininos e a autonomia das mulheres, consolidando sua posição como seres subordinados a um projeto nacionalista que limitava suas liberdades em prol de uma suposta regeneração da nação grandiosa.

From the studies in the history of law it can be verified that small ideas and social movements, that emerged in the time, caused great transformations in the legal, political and social fields, evidencing the existence of a chain of ruptures and continuities. In this sense, gender studies are fundamental to understand the role of women in the social and historical context, as well as their resistance, always starting from the premise that there is a structural subordination imposed by the patriarchy. Based on this perspective, the research adopts a historical-critical approach to analyze the legal status of women and gender inequality in the Vichy regime (1940- 1944), marked by strong conservatism and repression. From primary sources and bibliographies, we seek to understand the impact of the regime on women’s lives, addressing issues such as sexual and reproductive rights, the imposition of domestic role to women and the moral obligation to mothering. The objective was to build a critical overview of women’s role in this specific historical context and broaden the understanding of gender structures in society. After the defeat of France in World War II and the occupation by the Nazis, the Vichy regime led by Philippe Pétain adopted an authoritarian ideology, centered on the pillars of conservatism. Promoting traditional values, the government highlighted motherhood as a patriotic duty, restricting the female role to the domestic sphere and reinforcing morality, with support from the Catholic Church. The policies in favor of the family, according to the official speech, aimed to increase the birth rate and strictly control female sexuality, making abortion a crime against the state and repressing practices such as adultery and prostitution. Thus, the policy of Vichy fostered a rigid control over the female bodies and the autonomy of women, consolidating their position as subordinated beings to a nationalist project that limited their freedoms in favor of a supposed regeneration of the great nation.