Tempo e poder em processos de aprendizagem organizacional: um estudo de caso sobre mudanças do uniforme da Polícia Rodoviária Federal

Abstract

Nos estudos organizacionais, temas como mudança e inovação cresceram substancialmente, enquanto a preocupação com a estabilidade das instituições decresceu. Compreender conjuntamente o que muda e o que permanece pode fornecer evidências mais abrangentes sobre como as organizações operam. O conceito de renovação estratégica abrange a mudança e a permanência e uma maneira de observar esse processo é por meio da aprendizagem organizacional (AO), analisado de forma multinível (indivíduo, grupo, organização), com o fluxo da mudança (feed-forward) e da permanência (feedback). Esse processo dinâmico e circular é influenciado por processos de poder que, dependendo de sua natureza ? episódica ou sistêmica ?, apoiam ou dificultam os fluxos e modificam padrões temporais ? o ritmo ou a estabilidade da instituição. Para analisar as conexões entre AO, em uma estrutura multinível; poder, com modos episódicos e sistêmicos; e tempo, analisando o ritmo e a estabilidade de instituições, definimos como objetivo desta pesquisa o de compreender como as dinâmicas de poder afetaram as mudanças do uniforme da Polícia Rodoviária Federal nos últimos 30 anos, a partir da lente teórica da aprendizagem organizacional. Para isso, foi realizado um estudo de caso qualitativo, tendo como foco três mudanças no uniforme operacional de uma organização policial, utilizando as técnicas de observação, pesquisa documental e entrevistas. A partir da construção de uma narrativa com uma descrição densa das mudanças no uniforme nos últimos 30 anos, foram identificados processos de aprendizagem ? intuição, interpretação, integração e institucionalização ? relacionados às alterações do uniforme e processos de poder episódicos e sistêmicos ? influência, força, disciplina e dominação ? que apoiaram ou foram contrários às mudanças. Diferentemente do descrito na literatura, encontramos evidências de que o processo de integração foi auxiliado não pela força, mas por processos relacionados ao sujeito, como a influência e, principalmente, a disciplina. Esta se mostrou um dos exercícios de poder mais efetivos, observando-se que auxiliava não apenas a intuição, mas todos os outros processos de aprendizagem. Ao adicionar o tempo a essa análise, verificamos as diferenças no ritmo e estabilidade de cada institucionalização. Encontramos diferenças significativas e percebemos que os processos de poder que apoiaram os de aprendizagem agiram em determinados momentos específicos da instância de institucionalização. Em seu início, por processos mais persuasivos e, mais ao final, apoiada por processos mais coercitivos. Além disso, por mais que organizações públicas possuam vários entraves e barreiras para a aprendizagem organizacional, como gestão centralizada, normas rígidas, alto controle etc., vimos uma aprendizagem espontânea, não planejada, que teve sua gênese na linha de frente e avançou até ser instituída, contornando obstáculos. Por fim, mostramos que o processo de feedback tem dupla função dependendo do tipo de poder que o acompanha: apoiado pela força, conseguiu atrasar e dificultar a nova aprendizagem, mas apoiado pela disciplina, carregou elementos presentes em processos passados de intuição, interpretação, integração e institucionalização para novas aprendizagens, formando uma espécie de síntese de aprendizagens anteriores. Assim, mostramos que a complexidade do fenômeno reside nessa dicotomia que engloba mudança e estabilidade: não é simplesmente uma mudança, é algo novo, mas que carrega consigo as aprendizagens anteriores, um processo dinâmico e circular, o motor perpétuo da aprendizagem.

Abstract: In organizational studies, themes such as change and innovation have grown substantially, while the concern with the stability of institutions has decreased. Jointly understanding what changes and what remains can provide more comprehensive evidence about how organizations operate. The concept of strategic renewal encompasses change and permanence and one way of observing this process is through organizational learning (OL), analyzed in a multilevel way (individual, group, organization), with the flow of change (feed-forward) and permanence (feedback). This dynamic and circular process is influenced by power processes, which, depending on their nature ? episodic or systemic ? support or hinder flows and modify temporal patterns ? the rhythm or stability of the institution. To analyze the connections between AO, in a multilevel structure; power, with episodic and systemic modes; and time, analyzing the rhythm and stability of institutions, we defined the objective of this research to understand how the dynamics of power affected the changes in the uniform of the Federal Highway Police in the last 30 years, from the theoretical lens of organizational learning. For this, a qualitative case study was carried out, focusing on three changes in the operational uniform of a police organization, using observation techniques, documentary research and interviews. From the construction of a narrative with a dense description of changes in the uniform in the last 30 years, learning processes were identified - intuition, interpretation, integration and institutionalization - related to changes in the uniform and episodic and systemic power processes - influence, strength, discipline and domination ? who supported or opposed the changes. Unlike what is described in the literature, we found evidence that the integration process was aided not by force, but by processes related to the subject, such as influence and, mainly, discipline. And discipline proved to be one of the most effective power exercises, as it was observed to help not only intuition, but all other learning processes. By adding time to this analysis, we see differences in the pace and stability of each institutionalization. We found significant differences and realized that the processes of power that supported those of learning acted at certain specific moments of the institutionalization instance ? at the beginning by more persuasive processes and, later, supported by more coercive processes. In addition, even though public organizations have several obstacles and barriers to organizational learning, such as centralized management, strict rules, high control, etc. instituted, bypassing obstacles. Finally, we show that the feedback process has a dual function depending on the type of power that accompanies it: supported by force, it managed to delay and hinder new learning, but supported by discipline, it carried elements present in past processes of intuition, interpretation, integration and institutionalization for new learning, forming a kind of synthesis of previous learning. Thus, we show that the complexity of the phenomenon resides in this dichotomy that encompasses change and stability: it is not simply a change, it is something new, but that carries with it previous learning, a dynamic and circular process, the perpetual engine of learning.