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Este trabalho teve como objetivo compreender a lógica disciplinar, de controle e de governo que legitima e regulamenta o uso do caderno de ocorrências em uma escola pública de anos iniciais, por meio de análise de documentos, estudo de caso e entrevista semiestruturada. Buscou investigar como as práticas disciplinares, de controle e de governo se inserem nas instituições escolares, tomando como base o pensamento foucaultiano. Pesquisou o surgimento da prática dos registros de comportamentos inadequados, a partir da análise de documentos que continham decretos que recomendavam essa prática no estado do Paraná. Investigou a regulamentação, o uso, a função e os efeitos dos cadernos de ocorrências nos sujeitos pertencentes à escola pesquisada. Para tanto, analisou os aspectos políticos e institucionais que regulamentam e normatizam o uso do caderno de ocorrências, examinando os seguintes documentos organizadores do trabalho pedagógico: Plano Municipal de Educação, Projeto Político-Pedagógico e Regulamento Interno, entendidos como estratégias daquilo que Foucault denominou biopolítica, que se utilizam de conhecimentos produzidos sobre as crianças, a didática e a escola para governar a infância. Também considerou o ritual que compõe o ato de assinar o caderno de ocorrências, que se utiliza de práticas judiciárias que objetivam e subjetivam os sujeitos registrados. Por fim, empreendeu-se uma análise da frequência dos registros, verificando quem figurava no caderno, quais situações originavam as ocorrências, como os envolvidos se justificavam e quais as providências tomadas por aqueles que efetuavam o registro. As análises apontaram para o caderno de ocorrências como uma prática de disciplinarização, controle e governo dos alunos e de seus familiares que objetiva trazer os envolvidos à norma, com o intuito de restabelecer a ordem e moralizar os sujeitos registrados. Percebeu-se uma ruptura em seu uso a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente, que torna crime colocar as crianças em situações vexatórias, de constrangimento ou de discriminação. Nesse sentido, o caderno de ocorrências passou a assumir o estatuto de defesa da escola contra possíveis omissões, uma prova de que a escola resguarda o direito de seus alunos. A análise das frequências apontou para um decréscimo considerável dos registros, pois na nova economia disciplinar o caderno de ocorrências não se apresentou mais tão eficaz como prática de controle, governo e disciplinarização. Isso demonstrou que as formas de resistências - materializadas na recusa em modificar os comportamentos e no descaso pelos seus efeitos manifestado pelos alunos reincidentes, na indisponibilidade das famílias em permitir que a escola conduza e reconduza suas formas de viver, nos silêncios que manifestam a recusa de confessar e de assumir a culpa - ocupam os espaços vazios das práticas disciplinares, produzindo novas formas de fazer na escola. |
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