Infância, sofrimento e laço social: considerações psicanalíticas sobre a criança do século XXI

DSpace Repository

A- A A+

Infância, sofrimento e laço social: considerações psicanalíticas sobre a criança do século XXI

Show full item record

Title: Infância, sofrimento e laço social: considerações psicanalíticas sobre a criança do século XXI
Author: Werner, Patricia Simões de Almeida Justo da Silva
Abstract: A presente tese, orientada pelos fundamentos da psicanálise freudolacaniana, propôs uma reflexão crítica sobre os modos de comparecimento do sofrimento psíquico na infância no século XXI, considerando sua articulação com as transformações culturais, os discursos normativos e os rearranjos no campo da parentalidade e da família. Partindo da escuta clínica da primeira infância, a tese buscou desmontar a ideia da ?criança generalizada?, figura abstrata que opera a homogeneização dos sujeitos e sua consequente submissão a discursos patologizantes, desenvolvimentistas e medicalizantes. A pesquisa se inseriu na vertente da psicanálise aplicada e teve caráter qualitativo. Recolheu fragmentos da clínica e da cultura para compor uma leitura dos contornos do atual mal-estar e de como ele tem chegado às crianças. O trabalho está estruturado em seis capítulos principais que se desdobram em eixos conceituais e clínicos que apontam para alguns dos modos como a cultura atual ? marcada pela presença do discurso capitalista, pelo culto à performance, pela racionalidade técnico-científica e pela presença da virtualidade, ? repercute sobre a constituição subjetiva. A parentalidade, enquanto posição discursiva, foi discutida em sua articulação com a função paterna e com o desejo da mãe, e problematizada a partir do declínio do Nome-do-Pai e dos efeitos subjetivos daí advém. Investigou-se, assim, a desorientação dos pais, a fragilidade na sustentação de limites e a emergência de ?terceiros? especialistas que ocupam o lugar da autoridade outrora exercida por eles. O sintoma infantil foi tematizado como modo de inscrição subjetiva no laço familiar. Analisou-se a crescente demanda por diagnósticos e a consequente patologização da infância, com destaque para o que chamamos dos ?excessos pulsionais não contingenciados?, que são interpretados como respostas do sujeito à crise da transmissão e às exigências de desempenho e ajustamento. O trabalho articulou ainda o deslocamento da criança de lugar de desejo para lugar de gozo, enfatizando a criança como depositária do ideal de felicidade. O brincar, em sua função simbólica, foi retomado como atividade essencial à subjetivação e à elaboração dos impasses do real. Contudo, o excesso de objetos, a hiperconectividade e a captura pela lógica do consumo foram apontados como entraves contemporâneos à função elaborativa do brincar. Discutiu-se o impacto das tecnologias, da virtualidade e do discurso do capitalista sobre o corpo e o laço social da criança, assim como o imperativo de gozo que suplanta a lógica da castração. Como resultado de um percurso de reflexão crítica, buscamos trazer um posicionamento de negação da naturalização de um modelo universal de subjetivação infantil e enfatizamos a importância da escuta da criança como sujeito singular, atravessado por discursos, fantasmas parentais, marcas da cultura e da linguagem. Defendemos que o sofrimento psíquico infantil, longe de ser apenas um déficit ou falha neurobiológica, possa ser compreendido como uma resposta criativa do sujeito frente aos ideais sociais e parentais, delatando os impasses dos tempos em que vivemos.Abstract: This doctoral dissertation, grounded in the principles of Freudo-Lacanian psychoanalysis, proposes a critical reflection on the manifestations of childhood psychic suffering in the 21st century, considering its articulation with cultural transformations, normative discourses, and changes in the domains of parenthood and family. Based on clinical listening in early childhood, the thesis aims to deconstruct the notion of the \"generalized child\"?an abstract figure that promotes the homogenization of subjects and their consequent submission to pathologizing, developmentalist, and medicalizing discourses. The research follows the path of applied psychoanalysis and adopts a qualitative approach. It gathers fragments from clinical practice and culture to outline a reading of the contours of contemporary malaise and how it manifests in children. The work is structured into six main chapters, which unfold into conceptual and clinical axes pointing to some of the ways in which contemporary culture?marked by the presence of capitalist discourse, the cult of performance, technoscientific rationality, and pervasive virtuality?impacts the formation of subjectivity. Parenthood, as a discursive position, is discussed in its articulation with the paternal function and the mother's desire and is problematized in light of the decline of the Name-of-the- Father and its subjective consequences. The thesis investigates parental disorientation, the weakening of symbolic limits, and the emergence of ?third-party? specialists who have come to occupy the position of authority formerly held by parents. The child?s symptom is addressed as a mode of subjective inscription in the family bond. The growing demand for diagnoses and the resulting pathologization of childhood are analyzed, with particular attention to what is referred to as ?uncontained drive excesses,? interpreted as subjective responses to the crisis of transmission and the demands for performance and adjustment. The work also addresses the shift of the child from a place of desire to a place of jouissance, emphasizing how the child becomes a repository of the ideal of happiness. Playing, in its symbolic function, is revisited as an essential activity for subjectivation and for the elaboration of real impasses. However, the excess of objects, hyperconnectivity, and the capture by consumerist logic are identified as contemporary obstacles to the elaborative function of playing. The impact of technologies, virtuality, and capitalist discourse on the child?s body and social bond is discussed, as well as the imperative of jouissance that overrides the logic of castration. As the outcome of a critical path of reflection, this research takes a stance against the naturalization of a universal model of child subjectivation and emphasizes the importance of listening to the child as a singular subject?one who is shaped by discourses, parental fantasies, cultural marks, and language. It argues that childhood psychic suffering?far from being a mere deficit or neurobiological failure?can be understood as a creative response by the subject to social and parental ideals, thereby exposing the impasses of our times.
Description: Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Florianópolis, 2025.
URI: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/270467
Date: 2025


Files in this item

Files Size Format View
PPSI1180-T.pdf 2.850Mb PDF View/Open

This item appears in the following Collection(s)

Show full item record

Search DSpace


Browse

My Account

Statistics

Compartilhar