Mira [Schendel] e Mirtha Dermisache: escritas e dispositivos editoriais

Abstract

A presente tese oferece uma leitura de uma seleção de obras realizadas entre as décadas de 1960 e 1970 pelas artistas Mira [Schendel] e Mirtha Dermisache, que problematizam a escrita e ressignificam diversos dispositivos editoriais. A nossa abordagem entende tais obras como experimentos escriturais e de edição que oscilam entre a imagem e a letra, cuja potência comove as relações entre tecnologias visuais, escriturais e espaciais, suas materialidades e seus suportes, bem como os campos disciplinares a que esses objetos se adscrevem. Não se trata de uma leitura comparativa entre a obra das duas artistas. Partimos da premissa de que elas respondem a pesquisas muito diferentes no nível plástico, mas que convergem em sua capacidade de produzir uma distância que permite um olhar renovado sobre os limites e as potencialidades da linguagem para além da própria comunicação. Nesse sentido, a hipótese defendida neste trabalho é de que ambas as obras tecem vasos comunicantes a partir de um fazer pós-textual. Isso significa que não remetem meramente ao esgotamento da enunciação (tema latente nas vanguardas do pós-guerra), e sim a uma torção da escrita e da letra sobre si mesmas, habilitando o questionamento das suas funções sociais e, sobretudo, da ideia de que a escrita, como expressão da linguagem, transmite informações. Esse dizer pós-textual abre espaço para repensar protocolos de leitura a partir de uma aproximação sensível, e não puramente intelectual, dos textos. Em outras palavras, ao refletir sobre a leitura a partir das obras de Mira [Schendel] e Mirtha Dermisache, observa-se que os significantes já não giram em falso ancorados na sua mesmidade, mas mantêm um elo radical com as materialidades que os determinam, embora elas sejam ainda um encontro com a contingência, o acontecimento, o mistério.

Abstract: This dissertation offers a reading of selected works created between the 1960s and 1970s by artists Mira [Schendel] and Mirtha Dermisache. These artworks problematize writing and re-signify various editorial devices. My research interprets them as experiments in writing and editing that oscillate between image and letter, with a potency that affectively moves the relations among visual, scriptural, and spatial technologies, their materialities and supports, as well as the disciplinary fields to which these objects belong. This is not a comparative reading of the two artists' works. I begin with the premise that they respond to very different investigations at the plastic level but converge in their capacity to create a distance that enables a renewed perspective on the limits and potentialities of language beyond communication itself. In this sense, the hypothesis advanced in this dissertation is that both bodies of work weave communicating vessels from a post-textual practice. This means they do not merely reflect the exhaustion of enunciation?a latent theme in postwar avant-gardes?but rather enact a twisting of writing and the letter upon themselves, enabling a questioning of their social functions and, above all, of the idea that writing, as an expression of language, transmits information. Thus, the post-textual opens a space to rethink reading protocols from a sensitive rather than purely intellectual approach to texts. In other words, by reflecting on reading through the works of Mira [Schendel] and Mirtha Dermisache, my research suggests that signifiers no longer spin in vain, anchored in their sameness, but instead maintain a radical link with the materialities that determine them?even as these same materialities remain encounters with contingency, unfolding, and mystery.