"Nada sobre nós sem nós": empoderamento, protagonismo e autonomia da população em situação de rua nas políticas sociais no Brasil

Abstract

Nos últimos anos, com crises econômicas e uma pandemia mundial, cresceram as discussões em torno do aumento expressivo da População em Situação de Rua ? PSR, e as questões sociais que ela desperta. As políticas públicas voltadas para a PSR no Brasil enfrentam diversos obstáculos em sua execução. A racionalidade neoliberal, com a máxima da individualização e da meritocracia resultam em falta de vontade política, aliada ao apoio da sociedade civil para o apagamento das demandas desse segmento, no que tange à garantia de direitos. É preciso entender, no entanto, que nem todos se enquadram nos padrões neoliberais de vida. Nesse contexto, a presente pesquisa tem o objetivo de problematizar as categorias de protagonismo, autonomia e empoderamento da PSR, presente nas normativas técnicas das políticas públicas, apresentando um contraponto com o sentido desses conceitos na racionalidade neoliberal. Considerando o compromisso ético com o lema dos militantes da PSR ? ?Nada sobre nós sem nós? ? o trabalho se inicia com a história de vida de uma representante do movimento, uma mulher, negra, com trajetória de vida nas ruas, cuja voz representa a PSR e a história ilustra muitos dos entraves à operacionalização das categorias abordadas. A partir dessa história, e outras memórias do campo, a pesquisa reflete sobre as condições opressoras que muitas vezes levam à situação de rua, além de todas as violências impostas a esse segmento populacional. Em seguida, aponta as interpelações dos conceitos de protagonismo, autonomia e empoderamento apresentando algumas contradições, mas também a importância desses conceitos na execução das políticas sociais. Por fim, a pesquisa aprofunda os impasses entre a execução adequada das políticas públicas para PSR e a racionalidade neoliberal, buscando destacar a importância do controle social e da conscientização dos trabalhadores a respeito de suas próprias práticas.

Abstract: In recent years, economic crisis and the global pandemic have fostered discussions about the significant growth of homelessness and the questions related to this. Public policies addressing homeless people in Brazil must face several hindrances in their implementation. Extreme individualism and meritocracy constitute the neoliberal rationality that materializes itself in lack of political will and scarce support of the civil society in measures to suppress the needs when it comes to guaranteeing the rights of the homeless people. Nevertheless, it is crucial to understand that not all people conform to neoliberal living standards. In this context, the present research aims to discuss the concepts of protagonism, autonomy and empowerment underlying the technical norms of public policies for homeless people, while acknowledging the opposition between these concepts and the neoliberal rationality. Ethically engaged with the motto of activists in the field of homelessness ? ?Nothing about us without us? ? the research starts presenting the story of one of the activist?s representatives: a black woman who experienced homelessness and whose voice represents the homeless people. Her story exposes various barriers to the practical implementation of the above-mentioned concepts in public policies. Based on her story and in other experiences gathered in field work, the research offers a reflection on the oppressive conditions that often result in homelessness, as well as the different forms of violence that homeless people frequently undergo. This reflection is followed by a critical examination of the concepts of protagonism, autonomy and empowerment that presents intrinsic contradictions, but also reinforces the importance of these concepts in putting these public policies into practice. Finally, the research delves into the challenges posed by the conflict between the proper implementation of public policies for homeless people and neoliberal rationality, highlighting the important role of social control in these policies, and the need for the workers who implement them to be aware of their own practices.