Abstract:
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A presente investigação, vinculada ao projeto de pesquisa intitulado “A (re)escravização e a escravização ilegal no debate jurídico oitocentista” versa sobre a escravização ilegal praticada no Brasil na segunda metade do século XIX e a resposta institucional a esse fenômeno. Nesse sentido, objetiva levantar, na literatura jurídica e em processos judiciais selecionados, o debate acerca da aplicação do artigo 179 do Código Criminal de 1830, referente ao crime de redução de pessoa livre à escravidão, pelo Poder Judiciário. Logo, procura identificar, em processos criminais por redução à escravidão de pessoas livres e ações cíveis envolvendo pessoas escravizadas, libertas e livres ilegalmente mantidas em cativeiro ou cuja liberdade encontrava-se ameaçada, a resposta judiciária aos casos. A fim de alcançar os objetivos propostos, a pesquisa analisou decisões judiciais emanadas em sede de processos civis e criminais selecionadas e editadas pela Gazeta Jurídica, revista mensal de doutrina, jurisprudência e legislação publicada entre os anos de 1873 e 1887 na cidade do Rio de Janeiro. Atentando ao conteúdo de todas as decisões judiciais publicadas pela revista, foram selecionadas aquelas em que verificada a citação explícita do artigo 179 do Código Criminal de 1830, a presença de elementos denunciantes da prática de redução da pessoa livre à escravidão ou a existência de circunstâncias, em sede de processos cíveis relativos a liberdade, relacionáveis a escravização ilegal. Como resultado, observou-se um pequeno número de processos criminais nos quais estava explícita ou implícita a prática do delito de redução da pessoa livre à escravidão. Em contrapartida, constatou-se um considerável número de processos cíveis nos quais a alegação de direito à liberdade e as circunstâncias dos casos envolvendo pessoas escravizadas, libertas e livres denunciava a prática desse crime. No que diz respeito à atuação do Poder Judiciário frente aos casos, verificou-se a existência de posicionamentos distintos a respeito da forma de resolução das situações, seja entre as diferentes instâncias, seja entre magistrados de mesma hierarquia. Entretanto, a tentativa de tipificação de condutas observadas em sede de processos cíveis e criminais como correspondentes ao artigo 179 do Código Criminal era minoritária e em muitas situações sequer acontecia. Essas conclusões denotam a existência, em maior ou menor grau, de uma relutância judiciária ao enquadramento das condutas relativas à redução de pessoa livre à escravidão ao artigo 179 do Código Criminal e, consequentemente, a responsabilização criminal dos supostos escravizadores, fatores que contribuem para com a perpetuação da escravização ilegal no Brasil oitocentista. |