Ecologia trófica dos ecótipos costeiro e oceânico de Tursiops truncatus no sul do Brasil

Abstract

A compreensão do nicho ecológico é fundamental para entender a distribuição das espécies, mas sua aplicação para espécies muito móveis, como de cetáceos, é complexa. Isótopos estáveis de carbono e nitrogênio tem sido utilizados para estimar o nicho isotópico, proxy do nicho ecológico. No Atlântico Sul Ocidental (ASO), dois ecótipos do golfinho-nariz-de-garrafa, costeiro e oceânico, co-ocorrem em uma área estreita da costa. Até o momento, nenhum estudo buscou investigar os aspectos ecológicos que permitiriam esta aparente sobreposição de nicho, que pressupõe competição por recursos. Aqui, analisamos as composições isotópicas de carbono e nitrogênio (d13C e d15N) das camadas de crescimento de dentina nos dentes de indivíduos dos dois ecótipos (Ncosteiro= 15 e Noceânico= 13) para investigar as dimensões trófica, espacial e temporal do nicho isotópico de ambos. Mais especificamente, investigamos: (1) diferenças no valores de d13C e d15N entre os ecótipos; (2) mudanças ontogenéticas no uso de recursos em cada ecótipo; e (3) o grau de especialização individual de cada ecótipo. Para cada ecótipo: calculamos a área padrão de elipse corrigida para pequenas amostras (AEc) e o grau de sobreposição das mesmas; ajustamos modelos aditivos generalizados mistos aos dados de d13C e d15N para verificar mudanças ontogenéticas no uso de recursos; e, consideramos a razão entre a variância dentro de cada indivíduo pela variância dentro da população/ecótipo como um índice de especialização individual para cada um. Apenas os valores de d13C diferiram entre os ecótipos (d13Ccosteiro = -12,7 ? e d13Coceânico = -14,3 ?; t = 4,87; df = 26; p-value < 0,0001) e uma pequena sobreposição das AEc foi verificada. O desmame ocorre entre 2-3 anos de idade para ambos. E especialização individual foi observado em ambos ecótipos. Nossos resultados sugerem um grau partição de nicho espacial entre os dois grupos, mas reforça a hipótese de distribuição parapátrica com uma ?zona de contato? entre os dois ecótipos. A dieta do ecótipo costeiro é fortemente associada a habitats costeiros e estuarinos e do ecótipo oceânico a habitats pelágicos.

Abstract: The comprehension of the ecological niche is key to understand the distribution of species. For highly mobile species such as cetaceans applying this concept by conventional methods is challenging. Carbon and nitrogen stable isotopes have been used to estimate the isotopic niche, a proxy for the ecological niche. In the western South Atlantic Ocean (wSAO), coastal and offshore ecotypes of the bottlenose dolphin co-occur in a narrow coastal strip area. However, no study has investigated the ecological aspects allowing this overlapped distribution, which foresees some kind of resource competition. Here, we analysed carbon and nitrogen isotope values (d13C and d15N) of dentin growth layer groups in each individual tooth (Ncoastal= 15 and Noffshore= 13) to investigate the trophic, spatial and temporal dimensions of the isotopic niche of both ecotypes. Specifically, we aimed to evaluate: (1) variations in mean isotopic values of d13C and d15N between ecotypes; (2) ontogenetic shifts on resources use within ecotypes; and (3) the degree of individual specialization of each ecotype. We calculated the Standard Ellipse Areas corrected for small sample sizes (SEAc) for each ecotype and measured the degree of overlap between them, we also adjusted Generalized Additive Mixed Models to age-specific data of d13C and d15N to verify ontogenetic variations in resources use. To estimate the degree of individual specialization we used the ratio of mean within individual variation by that of the population. Mean isotopic values differed significantly only for carbon values (d13Ccoastal = -12.7 ? and d13Coffshore = -14.3 ?; t = 4.87, df = 26, p-value < 0.0001) and a small overlap between both ecotypes SEAc was observed. Weaning occur around 2-3 years old for both ecotypes. And individual specialization was evident in both ecotypes. Our results suggest a degree of habitat partitioning, but reinforce the hypothesis of a parapatric distribution with a ?contact zone? of both ecotypes. The coastal ecotype?s diet is strongly associated with coastal and estuarine habitats whereas the offshore ecotype explores mostly pelagic prey.