"Frutos do suor": relações de exploração, produção e dependência do trabalho doméstico na corte imperial (1822-1888)

Abstract

O mercado de trabalho doméstico no Rio de Janeiro entre os anos 1820 e 1880 era heterogêneo do ponto de vista do sexo, origem, condição jurídica, idade e cor. Todas estas características, somadas a pobreza desta parcela da classe trabalhadora urbana provocavam situações de vulnerabilidade social que abriam precedentes para relações marcadas pela dependência e moldadas pela escravidão. O trabalho doméstico era realizado por escravos, mas também por libertos e livres pobres, especialmente do sexo feminino. Esta tese tem como objetivo compreender aspectos das relações de exploração, produção e dependência do trabalho doméstico de livres e libertas na corte Imperial, reconhecendo as influências das categorias de gênero, raça e classe no cotidiano das trabalhadoras e seus patrões. O trabalho doméstico constituía-se em atividade econômica fundamental tanto para quem contratava quanto para quem era contratado e configurava-se em estratégia de sobrevivência de trabalhadoras pobres das áreas urbanas. As fontes utilizadas nesta pesquisa são anúncios do Jornal Diário do Rio de Janeiro e processos civis empreendidos por mulheres que foram à justiça reivindicar soldadas, ou seja, pagamentos por serviços domésticos realizados. A partir destes documentos foi possível discutir a atuação das trabalhadoras domésticas nos espaços públicos e privados, os limites entre o trabalho doméstico remunerado e não remunerado, as aproximações existentes entre os serviços das domésticas e outros ofícios urbanos e em que medida os pressupostos de afeto e proteção turvavam as fronteiras entre trabalho e dependência, colocando em questão a remuneração. As contendas jurídicas analisadas nos dão pistas acerca do que se considerava ser o trabalho de uma criada doméstica e sobre o paradoxo gerado pela oposição entre remuneração e dependência. Os entendimentos de empregada e empregador acerca dos significados destas relações poderiam ser distintos e terminavam em disputas sobre os papéis que cada um ocupava na vida do outro.

Abstract : The domestic labor market in Rio de Janeiro between the years 1820 and 1880 was heterogeneous from the point of view of gender, origin, legal status, age and color. All these characteristics, added to the poverty of this portion of the urban working classes, provoked situations of social vulnerability that opened precedents for relations marked by the dependence and molded by the slavery. Domestic work was carried out by slaves, but also by poor free and freed persons, especially women. The purpose of this thesis is to understand aspects of the relations of exploitation, production, and dependence on the domestic work of free and formerly enslaved persons in the Imperial court, recognizing the influences of the categories of gender, race and class in the daily life of the workers and their employers. Domestic work constituted a fundamental economic activity for both those who hired and those hired, and it was a survival strategy for poor working women in urban areas. The sources used in this research are advertisements of the newspaper "Diário do Rio de Janeiro" and civil cases undertaken by women who have been brought to justice to claim soldadas , that is, payments for domestic services performed. From these documents, it was possible to discuss the role of domestic workers in public and private spaces, the limits between paid and unpaid domestic work, the approximations existing between domestic services and other urban services, and to what extent the assumptions of affection and protection blurred the boundaries between work and dependency, calling into question the payment for services rendered. The legal disputes analyzed provide important insight into what was considered to be the work of a domestic servant in the period, and the paradox generated by the opposition between wage labor and dependency. Employee and employer understandings about the meanings of these relationships could be distinct and ended in disputes over the roles each one played in the lives each other.