Abstract:
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Desde a década de 1970, verifica-se uma proliferação de instrumentos jurídicos internacionais de tutela do meio ambiente. O Direito Internacional do Meio Ambiente expande-se em resposta a desafios ambientais que se apresentam à humanidade. As mudanças climáticas, causadas pelas emissões antrópicas de gases de efeito estufa (GEE), constituem, provavelmente, o maior desses desafios ambientais, tendo em vista o fato de que se relaciona, diretamente, com o estilo de vida adotado (ou desejado) pela maior parte das sociedades humanas, o que complica a adoção de medidas para lidar com o problema. Desta forma, as negociações internacionais sobre o tema resultaram apenas na constituição de um regime internacional de tutela jurídica do clima que se mostra insuficiente diante da magnitude deste desafio. Além disso, nem todos os grandes emissores de gases de efeito estufa possuem a obrigação de reduzir suas emissões, notadamente os Estados Unidos, pois não ratificaram o Protocolo de Quioto, peça-chave do regime. Outrossim, países em desenvolvimento que são grandes emissores de gases de efeito estufa, como a China, a Indonésia, o Brasil e a Índia, não estão sujeitos a quaisquer obrigações de reduzir suas emissões e, por fim, não há qualquer incentivo, no regime internacional, para a redução de emissões decorrentes do desmatamento. É neste contexto que o Estado do Amazonas, uma unidade subnacional do Brasil, editou a Lei Ordinária Estadual n. 3135/2007, bem como outros instrumentos legais, e elaborou uma política específica para as mudanças climáticas, ainda que o Brasil ainda não o tenha feito; ainda, o estado busca o desenvolvimento de mecanismos de mercado para incentivar a redução de emissões decorrentes do desmatamento, uma postura que é diferente da adotada pelo Brasil. Cabe destacar, ainda, que a Lei n. 3135/2007 define, expressamente, em seu texto, a sua relação direta com o direito internacional. A conduta amazonense parece responder a um anseio das sociedades local e global, além de, possivelmente, resultar numa relativização do conceito de soberania e no exercício de funções típicas de direito internacional. Deste modo, este trabalho tem o objetivo de verificar se o estado do Amazonas, à luz da doutrina antiformalista francesa, desempenhou funções de direito internacional ao elaborar legislação específica para lidar com as mudanças climáticas. A escolha desta doutrina resulta do fato de ela se mostrar mais adequada para a explicação de fenômenos jurídicos que fogem das noções mais tradicionais. Para atingir o objetivo deste trabalho, faz-se: em primeiro lugar, uma exposição do pensamento antiformalista francês, com ênfase em Léon Duguit, Nicolas Politis e Georges Scelle; em segundo lugar, analisa-se a expansão da tutela jurídica do meio ambiente e a construção do regime internacional de tutela jurídica do clima; em terceiro lugar, analisa-se a relação da legislação amazonense sobre mudanças climáticas com o direito internacional. Por fim, conclui-se que o estado desempenhou, sim, funções de direito internacional e que isto, provavelmente, resultou de pressões tanto internas como externas, bem como da percepção de que o estado poderia auferir ganhos políticos e econômicos ao adotar esta legislação. Since the 1970s, legal instruments aimed at environmental protection have been proliferating. International Environmental Law has been expanding as an answer to environmental challenges faced by mankind. Climatic changes caused by manmade greenhouse gases (GHG) emissions are probably, the greatest of such challenges, since it is directly related to the lifestyle adopted (or desired) by most of the current human societies, which makes it more difficult to cope with the problem. Therefore, the international negotiations concerning the matter have resulted only in the establishment of an international legal protection regime for the climate which is considered insufficient due to the magnitude of the challenge. Moreover, not all of the great greenhouse gases emitters are obliged to reduce their emissions, notably the United States, since they have not ratified the Kyoto Protocol, a key piece of the regime. Furthermore, developing countries which are also large emitters, such as China, Indonesia, Brazil and India, are not subject to any obligations to reduce their emissions and, finally, there are not any incentives, in this international regime, to the reduction of emissions from deforestation. It is in this context that the State of Amazonas, a Brazilian sub-national unit, has enacted State Ordinary Law # 3135/2007, as well as other legal instruments, and has designed a specific policy to address the issue of climate changes, even though Brazil has not yet adopted similar measures; furthermore, the State is willing to develop market mechanisms in order to promote the reduction of emissions from deforestation, a rather different position from that of Brazil. It should be noted that the Law # 3135/2007, directly in its text, provides for the relation between itself and International Law. The conduct adopted by the State of Amazonas seems to address an aspiration from local and global societies, besides, possibly, result in a relativization of the concept of sovereignty and in the performance of typical functions of international law. Therefore, this work aims at verifying if the State of Amazonas, under the French antiformalist legal doctrine, has performed functions of international law when it enacted a specific legislation to address the issue of climate change. The choice of this doctrine derives from the fact that it is more adequate to explain legal phenomena which do not fit in more traditional notions. To achieve the goal of this work: firstly, an exposition of the French antiformalist legal thought is performed, taking into special consideration Léon Duguit, Nicolas Politis and Georges Scelle; secondly, an analysis of the expansion of the juridical protection of the environment and the construction of the international regime to address the climate is performed; thirdly, an analysis of the legislation from the State of Amazonas and International Law is executed. Finally, it is concluded that the State has indeed performed international law functions and that it, probably, resulted both from internal and external pressures, as well as from the perception that the State could potentially obtain political and economic gains by adopting such legislation. |