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O presente relatório apresenta os resultados do projeto de Iniciação Científica desenvolvido no âmbito do PIBIC, cujo objetivo foi investigar o fenômeno da investigação do feminicídio em Santa Catarina, com foco nos desafios investigativos enfrentados por delegados da Polícia Civil do estado. O estudo buscou compreender de que modo estruturas biopatriarcalistas se articulam em um mecanismo necrobiopolítico que influencia a interpretação e a aplicação da Lei do Feminicídio (Lei n. 13.104/2015) pelos agentes de justiça. A pesquisa utilizou uma abordagem qualitativa feminista com perspectiva narrativo-crítica para analisar dados derivados da pesquisa de maior amplitude “Variáveis Psicossociais Associadas ao Feminicídio em Santa Catarina”. A coleta de dados originalmente foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas com 20 delegados de polícia (13 homens e 7 mulheres, todos cisgêneros) responsáveis por investigações de homicídios femininos ocorridos após a promulgação da Lei do Feminicídio. O material empírico foi analisado mediante procedimentos de análise temática, orientados por perguntas-chave e estratégias de desconstrução, o que possibilitou a identificação de dois temas centrais relacionados às práticas investigativas: “reflexos do patriarcalismo nas investigações” e “sentidos atribuídos ao letramento de gênero na formação profissional”. Os resultados apontam que a compreensão do feminicídio por parte dos delegados permanece fortemente restrita ao âmbito doméstico e familiar, desconsiderando outras motivações de gênero em contexto de feminicídio não-privado. Verificou-se ainda a dificuldade em reconhecer situações de menosprezo e discriminação contra mulheres em cenários impessoais, bem como a tendência a associar o perfil da vítima a papéis sociais tradicionais, o que exclui da proteção legal mulheres insubmissas e corpos feminizados dissonantes. Observou-se também significativa carência de letramento de gênero entre os profissionais entrevistados, marcada pelo desconhecimento de protocolos específicos de investigação e pela reprodução de estereótipos de gênero. Em síntese, os achados evidenciam que concepções patriarcais e uma interpretação restritiva do gênero continuam a orientar as práticas investigativas, refletindo lacunas legislativas e a persistência de uma misoginia estrutural. Conclui-se que olhar para as narrativas dos agentes de justiça é relevante para compreender como estruturas biopatriarcais operam em um mecanismo necrobiopolítico, trespassando a interpretação e a aplicação das leis de proteção às mulheres. |
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