As mulheres e a psiquiatria vinte anos após a promulgação da Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira

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As mulheres e a psiquiatria vinte anos após a promulgação da Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira

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Title: As mulheres e a psiquiatria vinte anos após a promulgação da Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira
Author: Conci, Juliana Deboni
Abstract: Esta pesquisa analisa a relação entre mulheres e a psiquiatria vinte anos após a promulgação da Lei da Reforma Psiquiátrica no Brasil, investigando como os dispositivos normativos operam na constituição de subjetividades femininas sob o signo do cuidado em saúde mental no município de Erechim/RS. Com base nos aportes teóricos de Michel Foucault e Judith Butler, a pesquisa explora como os discursos psiquiátricos inscritos nos laudos médicos ? produzidos entre 2022 e 2024 ? revelam a imbricação entre poder, gênero e normatividade, evidenciando a produção de vidas precarizadas e controladas por meio de práticas institucionais. A análise do corpus documental, composto por 127 laudos psiquiátricos, identificou cinco eixos analíticos centrais: a produção de enunciados a partir de normas de gênero e do ideal materno, a moralização das condutas femininas, a redução de problemas sociais a diagnósticos clínicos, a medicalização da precariedade e as resistências ao dispositivo psiquiátrico. Os resultados apontam que, mesmo sob a égide da reforma psiquiátrica, práticas que reiteram dinâmicas hospitalocêntricas e disciplinadoras persistem, mobilizando discursos que patologizam a maternidade, silenciam os determinantes estruturais do sofrimento e invisibilizam as resistências dessas mulheres.A maternidade, em particular, emerge como um dispositivo regulatório central, frequentemente utilizado para justificar intervenções coercitivas ou medicalizantes, enquanto o uso de substâncias psicoativas e a vulnerabilidade social são transformados em marcadores de inadequação moral e clínica. Sob a ótica foucaultiana, esses dispositivos normativos produzem e regulam subjetividades femininas ao circunscrevê-las dentro de enquadramentos que simultaneamente individualizam e moralizam experiências marcadas por exclusão e desigualdade. Todavia, a pesquisa também evidencia brechas nas estruturas normativas. As resistências das mulheres, manifestadas por recusas ao tratamento ou pela reivindicação de agência em suas trajetórias, revelam fissuras nos dispositivos de controle e reafirmam a precariedade como um campo de luta política. Essa dimensão é aprofundada pelos conceitos de precariedade e enquadramento normativo de Butler, que permitem iluminar como certos corpos são relegados à invisibilidade e à abjeção, enquanto outros são reconhecidos como dignos de cuidado. Conclui-se que as práticas psiquiátricas contemporâneas, embora tensionadas pela lógica antimanicomial, ainda operam como tecnologias de poder que reproduzem desigualdades e reforçam os limites da norma. O estudo propõe deslocamentos éticos e políticos que rompam com a medicalização da precariedade e promovam um cuidado pautado na autonomia, na dignidade e no reconhecimento das mulheres como agentes de suas histórias.Abstract: This dissertation examines the relationship between women and psychiatry twenty years after the enactment of Brazil?s Psychiatric Reform Law, focusing on how normative frameworks operate in the constitution of female subjectivities within the mental health care system in Erechim, RS. Grounded in the theoretical contributions of Michel Foucault and Judith Butler, the study explores how psychiatric discourses inscribed in medical records?produced between 2022 and 2024?reveal the entanglement of power, gender, and normativity, shedding light on the production of precarious lives and their regulation through institutional practices. The analysis of the documentary corpus, composed of 127 psychiatric records, identified five central analytical axes: the production of statements informed by gender norms and the maternal ideal, the moralization of female behaviors, the reduction of social problems to clinical diagnoses, the medicalization of precarity, and resistances to psychiatric dispositifs. The findings indicate that, despite the ethos of psychiatric reform, practices perpetuating hospital-centered and disciplinary dynamics persist, mobilizing discourses that pathologize motherhood, silence the structural determinants of suffering, and obscure the resistances of these women. Motherhood emerges as a key regulatory dispositif, frequently used to justify coercive or medicalizing interventions, while substance use and social vulnerability are framed as markers of moral and clinical inadequacy. From a Foucauldian perspective, these normative dispositifs produce and regulate female subjectivities by inscribing them within frameworks that simultaneously individualize and moralize experiences shaped by exclusion and inequality. However, the research also uncovers cracks within these normative structures. Women?s resistances, expressed through treatment refusals or the assertion of agency in their trajectories, expose fissures in the mechanisms of control and affirm precarity as a site of political struggle. Butler?s concepts of precarity and normative frameworks deepen this analysis, illuminating how certain bodies are relegated to invisibility and abjection, while others are recognized as worthy of care. The dissertation concludes that contemporary psychiatric practices, despite the antimanicomial logic of reform, continue to function as technologies of power that reproduce inequalities and reinforce the boundaries of normativity. It calls for ethical and political shifts that transcend the medicalization of precarity and advocate for care grounded in autonomy, dignity, and the recognition of women as agents of their own histories.
Description: Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas, Florianópolis, 2025.
URI: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/265332
Date: 2025


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