Tendências temporais da diversidade funcional da comunidade bentônica recifal do Atol das Rocas, Brasil

Abstract

Os ambientes recifais abrigam a maior biodiversidade do ambiente marinho. Os organismos bentônicos que compõem esses ecossistemas são responsáveis por muitas funções ecossistêmicas, como ciclagem de nutrientes, produção primária, acreção de carbonato de cálcio. Ainda, organismos bentônicos conferem complexidade estrutural nos recifes. A complexidade é responsável por fornecer habitat para outros organismos marinhos, influenciando como eles interagem entre si e com o ambiente. Como resposta aos mais intensos e frequentes distúrbios climáticos nos últimos anos, recifes ao redor do mundo estão perdendo muitas dessas importantes funções, inclusive em ilhas oceânicas protegidas e remotas, como o Atol das Rocas. Como alternativa às abordagens taxonômicas, a utilização de uma abordagem funcional, a qual busca entender como as funções conduzem a dinâmica do ecossistema utilizando os atributos funcionais dos organismos, pode revelar dinâmicas temporais no funcionamento do ecossistema. O objetivo desse trabalho foi avaliar a dinâmica anual da diversidade funcional na comunidade bentônica recifal do Atol das Rocas entre 2013 e 2018. A comunidade bentônica foi amostrada anualmente por fotoquadrados em quatro áreas recifais fixas. Usando o software CPCe, os organismos foram quantificados e classificados de acordo com cinco atributos biológicos (tamanho máximo, tipo de crescimento, categoria trófica, modularidade e acreção de carbonato de cálcio) e um de história de vida (tipo de reprodução). Calculamos quatro índices de diversidade funcional (Riqueza Funcional - FRic, Entropia Funcional - FEnt, Redundância Funcional - FRed e Vulnerabilidade Funcional - FVul) para cada ano. Ao longo dos seis anos de monitoramento, foram identificadas 48 morfoespécies, distribuídas em 17 entidades funcionais (i.e. aquelas que compartilham os mesmos atributos). A FRic é baixa e similar ao longo dos anos, indicando pequenas mudanças nas funções ecossistêmicas. Porém, a FEnt oscilou temporalmente, indicando variações na porcentagem de cobertura de entidades funcionais com atributos funcionais mais dissimilares na comunidade. A FRed tende a decrescer e FVul a aumentar temporalmente, revelando menor riqueza de morfoespécies compondo determinadas entidades e realizando funções similares no ecossistema. Comunidades em ilhas oceânicas geralmente possuem baixa riqueza e redundância e, consequentemente, alta vulnerabilidade. No Atol das Rocas, onde a redundância já é baixa e mostra tendência decrescente, o movimento ou armazenamento de energia ou matéria por entidades funcionais chaves (como as compostas por organismos calcificadores) pode ser afetado. Uma possível consequência será a redução de taxas de acreção e produção de carbonato de cálcio e, portanto, redução da complexidade estrutural devido à diminuição de calcificadores, como corais e algas calcárias crostosas. Mesmo em uma ilha remota com pouco impacto antrópico como o Atol das Rocas, o sistema recifal pode estar se tornando ainda mais vulnerável não por conta da perda de entidades funcionais, mas pela redução da redundância e de suas abundâncias.

Abstract: Reef ecosystems have the highest biodiversity in marine environments. Important components of reefs, the benthic community associated to ecosystem functions as nutrient cycling, primary production, carbonate accretion and structural complexity. Reef complexity provides shelter for other marine organisms, dictating how they interact with each other and with the environment. As a response to more intense and frequent climate disturbances in the last years, reefs around the world are losing many ecosystem functions, even in protected and remote oceanic islands like Rocas Atoll. Functional diversity - measured through traits - offers a complementary approach to temporal dynamics and ecosystem functioning. The aim of this work was to evaluate temporal functional diversity patterns of the reef benthic community in Rocas Atoll, from 2013 to 2018. Reef benthic communities were annually sampled at four fixed areas. Using CPCe software, organisms were quantified and classified according to five biological traits (maximum size, growth form, trophic type, modularity, carbonate accretion) and one life history trait (reproduction type). We calculated four functional diversity indices (Functional Richness - FRic, Functional Entropy - FEnt, Functional Redundancy - FRed, Functional Vulnerability - FVul) for each year. During six years of monitoring, we identified 48 morphospecies distributed in 17 functional entities (i.e. those who share traits). FRic was low and similar across years, indicating small changes in ecosystem functions. However, FEnt varied temporally, indicating changes in percent covers of functional entities with unique trait combination. These entities were mostly macroalgae, responsible for primary production and reef tridimensional complexity. FRed declined while FVul increased temporally, thus less morphospecies are associated to functional entities across time. Communities in oceanic islands usually have low functional redundancy and, therefore, high vulnerability. At Rocas Atoll, the low functional redundancy and its decreasing trend over the years may compromise carbonate accretion rates and structural complexity due to the reduction of calcifiers, as corals and crustose coralline algae. Even in a remote island with reduced anthropic impacts like Rocas Atoll, the reef is possibly becoming more vulnerable by changes in functional redundancy and abundances.